2006-09-18

"O beijo", segundo Cyrano de Bergerac!

Hoje regresso às minhas origens. Não, não estou a falar das minhas origens brasileiras, mas antes à minha passagem por França. Para quem não sabe, antes de vir para Portugal, morei em Lyon durante oito anos. E se uma coisa valorizo no tempo que passei em terras gaulesas, foi a excelente educação que ali tive.

Sabem, é verdade que os franceses têm uma péssima tendência para o chauvinismo, para o pedantismo e, sim, em regra geral, não são propriamente amigos da higiene. Mas há uma coisa que eu aprendi a valorizar em França: o amor pela cultura e pelo conhecimento. Museus, bibliotecas, teatros, monumentos...

São estas as coisas que mais saudades deixam em mim, sobretudo vivendo agora num país onde a maioria pauta-se pelo 'faz de conta', onde as leituras de referência são os desportivos e a 'Maria' e cujos principais elementos culturais são pescados em odes ao idiotismo mental...

Sim, falo dos 'Morangos' e das 'Floribelas' que têm invadido o pequeno ecrã e que têm por único objectivo empobrecer a linguagem dos mais novos, padronizá-los aos conceitos de juventude definidos por senhores que só pensam em ganhar dinheiro vendendo lixo: D'Zrt e outras supostas 'bandas' que fora da novela não duram mais do que alguns meses, para não mencionar as saias e os batons usados por uma garota que já cobra mais de três mil euros por 15 minutos de autógrafos...

Tudo isto, para chegar a Savinien de Cyrano de Bergerac, poeta que viveu no século XVII em França, mas que acabou por ser imortalizado na obra de um outro autor francês, Edmond Rostand (1868-1918). A peça 'Cyrano de Bergerac', "un drame en cinq actes", é umas das minhas predilectas e hoje decidi partilhar convosco uma das suas passagens mais famosas.

Este excerto foi retirado do Acto III – Cena 10 e apresenta, basicamente, uma deliciosa definição do que é um beijo. E o motivo que me levou a escolher esta passagem? Simplesmente porque assim o quis...

Um beijo, afinal de contas, o que é?
Um juramento feito um pouco mais de perto, uma promessa
Mais precisa, uma confissão que quer confirmar-se,
Uma letra cor-de-rosa que se põe no verbo amar;
É um segredo que substitui a boca pelo ouvido,
Um momento de infinito que faz um zumbido de abelha,
Uma comunicação com gosto de flor,
Uma maneira de se respirar um pouco o coração
E de saborear, na ponta dos lábios, a alma!

Encantador, não acham?

Para a versão original deste texto - entenda-se com isto, a peça escrita em francês -, visitem o site Le Blog de Cyrano. Mesmo que não percebam muito de francês, vão ver que na língua original, o texto ganha uma força incrível. O blog tem lá a transcrição de toda a peça e, deixo assim, a minha recomendação para uma excelente leitura. Se não gostarem do francês, ou simplesmente não perceberem, procurem uma tradução em português porque vale mesmo a pena. E já agora, para os mais 'folgados', também há uma versão em filme com o Gerard Depardieu (1990), que está muito interessante.


"A lealdade e o respeito são uma forma de vida"
Aniki